quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Remota Aldeia - Aquarela recente. Madrugada na Aldeia - Poema de Cecília Meireles



Cassiano Pereira Nunes
As cidades XII - remota aldeia, 2013
aquarela s/ papel, 33,4 x 23,4 cm

Madrugada na aldeia
Madrugada na aldeia nervosa,
com as glicínias escorrendo orvalho,
os figos prateados de orvalho,
as uvas multiplicadas em orvalho,
as últimas uvas miraculosas.
O silêncio está sentado pelos corredores,
encostado às paredes grossas,
de sentinela.
E em cada quarto os cobertores peludos envolvem o
sono:
poderosos animais benfazejos, encarnados e negros.

Antes que um sol luarento
dissolva as frias vidraças,
e o calor da cozinha perfume a casa
com lembrança das árvores ardendo,
a velhinha do leite de cabra desce as pedras da rua
antiquíssima, antiquíssima,
e o pescador oferece aos recém-acordados
os translúcidos peixes,
que ainda se movem, procurando o rio.

Cecília Meireles. 
Mar absoluto, in Poesia completa.